segunda-feira, 18 de abril de 2016

A Melancolia da Derrota

Domingo. 17 de Abril do ano de 2016. Qualquer brasileiro que ligasse a TV a partir das 14h estava apto a assistir qualquer coisa, menos política! O que tomou conta do país ontem foi um processo que não fez vitoriosos. Mas serviu para afundar ainda mais suas vítimas: aqueles mesmos brasileiros que ligaram a TV.

O circo armado na Câmara Federal e, posteriormente, a apresentação das atrações principais deste circo corroeram a esperança do país em dias melhores. Claro que é público e notório o erro ao tentar resolver a atual situação brasileira com um processo de impeachment. Mas ontem foi diferente. Ontem a democracia assumiu estritamente o papel de dar voz a todos. E deu! Deu voz, inclusive, a quem não tinha nada de bom a falar. Deu voz a quem sabia o que falar e não falou. Deu voz a quem era melhor não ter falado. Deu voz a torturador, a fascista, a ladrão, a palhaço...

De todas as representações que usaram da palavra ontem, na Câmara, poucas me chamaram tanta atenção quanto a das mulheres favoráveis ao processo de cassação da Presidenta. Mulheres -  algumas negras, outras brancas - que falaram em prol do machismo melhor do que qualquer homem o faria na ocasião. Mulheres que ignoraram (ou na melhor das hipóteses e na mais ingênua, esqueceram) o que é ser mulher ao redor do mundo e, principalmente, no Brasil. Foram ao microfone corroborar com a ínfima participação feminina na política. Mulher que enalteceu o marido preso horas depois. Mulher que enalteceu o presidente da casa, que é contrário a ela.

Mas, verdade seja dita, tivemos as Jandiras, as Erundinas, as Marias...
Destaco aqui meu respeito pela Deputada Federal Margaria Salomão que fez e faz discursos brilhantes orgulhando homens e mulheres que, independente da ideologia apropriada por cada um, se identificam na convicção republicana da congressista.

Tivemos os Ivans, os Chicos, os Jeans que demonstraram a sensibilidade que o brasileiro consciente teria, naquele momento. Vimos horrores proferidos pelos abutres de sempre. Vimos Bolsonaro glorificando Ustra, o torturador. Vimos Deus votando. Nossa, como deus votou! Sinceramente, a pessoa que vos escreve não esperava isso de Deus. A família, a grande família brasileira se fez presente, reacionária como nunca. Infelizmente, alguns deputados ontem deixaram claro que não serão mais permitidas trocas de sexo de crianças, e isso é muito triste.
O processo beira à piada, mas é escárnio dos mais graves.

E a segunda-feira amanheceu áspera, até meio apagada. O desagrado dos derrotados impera nos vagões do metrô, nos pontos de ônibus, nas ruas em geral. Refiro-me aos 200 milhões de derrotados. Aos que nem sabem ainda que o são. Aos que vivem o (nem tanto) inocente vislumbre da ilusão. Brasília, ontem, pareceu uma metralhadora descontrolada, com poder de fogo suficiente para atingir todo o país. Cumpriu seu papel e se manteve de pé. A arquitetura de Brasília foi pensada no sentido de conferir a segurança dos congressistas, com seus gabinetes subterrâneos. Ontem, a história provou que até a arquitetura estava errada. Mais seguro seria submergir o resto do Brasil!

Que o episódio de ontem não levante nenhum brasileiro a lutar contra seu próprio povo. Por mais que a viabilidade do discurso "mas lá é a representação do povo que temos" seja verdadeira, vale a pena lembrar a informação veiculada pela Mídia Ninja: Só 36 daqueles deputados foram eleitos por seus próprios votos. Os outros 477 lá estão pelo sistema que soma votos de legendas e coligações. 
Que não nos levantemos contra o povo, mas sim contra o sistema falido, que já não representa mais nada a não ser a vontade escusa de congressistas abutres.

A melancolia da derrota está presente sim. O sumido Aécio Neves, em seu discurso de derrota nas eleições de 2014, disse: "a Presidente Dilma ganhou perdendo e nós perdemos ganhando". Era a primeira porta a ser aberta ao golpe. Mas, no dia de hoje, a frase faz sentido se considerarmos que qualquer um que se sentiu vitorioso, na noite de ontem, GANHOU PERDENDO.


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